06/12/2007

MORRER NO CAMPO DA BATALHA "verdade e ficção".

Para mim o destemido, o corajoso, o valente e porque não, por vezes, o justo, é o ladrão! Dependendo, claro, a quem ele rouba e o que rouba! Mais de que um soldado que vai para a guerra obrigado por uma causa que às vezes nem é sua nem é justa! Mais do que o toureiro que enfrenta um touro covardemente. Mais do que o corredor de fórmula um que corre escudado pela máquina e pelo dinheiro e mais do que outros pseudovalentões que tiveram sempre a "maminha" pronta e operam por simples vaidade ou exibicionismo. As razões porque falo nisso são muitas e só não concordarão aqueles que acima apontei nem os que caminham neste mundo envergando o manto do egoismo da injustiça, da incompreensão.
Apenas deixo aqui um pedido de reflexão. Uma pergunta. Quais as causas que levam à acção valente, destemida, corajosa, dos marginais? Quem podemos culpar pela brecha existente, essa tão flagrante lacuna? Certamente que a culpa não é dos marginais! Deles, é apenas a coragem que nós, os muito calminhos, os pusilanimes, os acomodados que por medo de perdermos os privilégios da subsistência, ficamos quietos deixando que tudo corra ao sabor do egocentrismo da nossa sociedade, representada por governos que apenas cuidam ou se preocupam com a segurança de seus " membros" de seus caprichos políticos e não adianta discriminar, o mal é de todos eles, porque todos tem seus privilégios, são bem remunerados, e em nada lhes afeta o vai-e-vem, a descida ou subida dos ( por eles decretados ) impostos! O povo, tão logo os contribuintes, que se fodam! Ora bem!

Foi assim. Patinhas era o nome dele. Português nascido em Setúbal, descendente de uma familia africana que na época de descolonização , imbuida pela nacionalidade que lhe atribuiram,veio para Portugal onde, claro, desde o dia que chegou, nunca deixou de ter dificuldades. Foram vivendo num bairro pobre e degradado e ali, aos trancos e barrancos, ainda nasceu desgraçadamente o Patinhas nas "margens" do rio Sado.
A história do Patinhas é igual a tantas, seja neste País seja noutros de igual "jaez" onde infelizmente, como acima referido, a mentalidade dos cidadãos, mais de seu regime, será dificil atingir o nível de um país civilizado. Morrerei de certeza com esse sonho que se prolongará na minha alma!

Patinhas desde cedo começou a sentir que a vida não era nada fácil. Ao seu redor, só deparava com fronteiras. As pessoas, de cor clara, aos seus olhos , escureciam e via naquilo que deveria ser sorriso, uma carranca hostil, ameaçadora!
Não vou enumerar as dificudades, as injustiças no trajecto da vida de Patinhas.
No abandono pelas ruas de seu bairro, na convivência e partilha de sentimentos com os outros de igual status, Patinhas enveredou, como era inevitável, pelos caminhos da "coragem" tornando-se um caprichoso e sentimental ladrão. Como o diria Jorge Amado: um "Capitão da Areia".

Sentimental porque jamais ele aplicou a força ou a raiva e nunca operou armado a não ser com a sua pistolinha de plástico.

E foi outro dia. Na Bento Jesus Caraça, na igreja N.Sra. da Conceição. Na entrada e na calçada estava uma multidão. Era de um funeral. Pensei tratar-se de um funeral de algum membro de familia cigana. Perguntei. E uma senhora me disse: O Patinhas foi morto ao empreender uma fuga dos policiais. Ele e mais 2 que perpetraram o assalto. Num carro roubado, fugindo da polícia, cairam duma ponte, tendo o Patinhas encontrado morte instantanea.
Pude observar o cortejo fúnebre, como a enterrar fosse um importante membro da cidade. Muita gente de todas as "cores" e um inúmero desfile de motares que em suas motos transmitiam música. Estava uma tarde suave, uma brisa leve, um sol muito amarelo e pude ver nos olhos de alguns dos motares lágrimas espargindo como diminutos arco-iris.

Segundo as opiniões que colhi, Patinhas era um "cara"legal. Simpático. Amigo dos amigos. carinhoso em retribuição a carinhos mas só na sua "tribo" claro!

Patinhas morreu no " Campo da Batalha"! Um "herói" sobre alguns pontos de vista!
texto de Manoel Carlos

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